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CapturarDando continuidade aos posts que publicamos sobre “empresas familiares”, hoje li um artigo muito interessante publicado no Portal HSM, pela Renata Bernhoeft (sócia da Bernhoeft Consultoria Societária e co-autora do livro Família, Família, Negócios à Parte). Dos artigos que já li sobre este assunto este posso considerar o mais claro e objetivo em termos de apresentar a realidade dos processos sucessórios em empresas familiares, mas principalmente apresentando uma solução digna de análise!

No artigo, Renata Bernhoeft mostra que o grande obstáculo de resolver os problemas sucessórios familiares é de tentar fingir que podemos resolver enxergando somente por uma dimensão, ou seja, a dimensão da gestão dos negócios, esquecendo que as dimensões da família e do patrimônio influenciam neste processo de sucessão familiar. O título do artigo é sugestivo: “Sucessão Tridimensional”.

No artigo, a autora sugere basicamente três sucessores para cada uma das dimensões a serem ajustadas. A partir desse ponto de vista, cai por terra a imagem de um sucessor único, o “escolhido”, geralmente aquele que vai assumir a gestão dos negócios. Na verdade, mais adequado é pensar em sucessores. Em outras palavras, considerando que cada um dos sistemas exige um processo de sucessão específico, os sucessores são aqueles que se legitimam na liderança de cada uma das três esferas família, patrimônio e empresa que compõem a sociedade familiar, assim como em seus diversos fóruns de decisão. Nos círculos da família e do patrimônio, o sucessor é necessariamente um dos familiares. Na empresa, pode ser um familiar ou não.

No final deste artigo, a autora salienta que a busca da legitimidade é fundamental, pois é importante que os futuros sócios participem ativamente da definição das futuras lideranças, a fim de que estas obtenham a legitimidade necessária para o exercício do poder, resumindo os primos, sobrinho e / ou filhos dos fundadores tem que demonstrar em suas atitudes que estão dispostos a substituir os fundadores.

Na sequencia, apresentamos o artigo na sua íntegra. Aos nossos clientes, desejamos que este artigo ajudem em seus planejamentos sucessórios. Ficaremos no aguardo dos seus comentários!

Sucessão Tridimensional – por Renata Bernhoeft

Mercados do mundo inteiro acompanharam com atenção os meses durante os quais se desenrolou o processo de sucessão de Jack Welch no comando da General Electric, até que o conselho de administração aprovou o nome de Jeff Immelt que assumiu a presidência da empresa em setembro de 2001. Todas as atenções se voltavam para a empresa, suas principais lideranças, suas características. Nada mais natural: nessa esfera se dariam os fatos decisivos para o futuro da organização.

Enquanto o processo sucessório em companhias como a GE acontece fundamentalmente em uma dimensão a da gestão dos negócios, a sucessão nas empresas de controle familiar se caracteriza por ser tridimensional. E esse aspecto vem sendo observado cada vez com maior atenção tanto pelos membros das famílias empresárias como pelo mercado clientes, fornecedores, instituições financeiras, concorrentes etc.

As sociedades familiares são sistemas constituídos por três subsistemas: o da família, o do patrimônio e o da empresa. Inicialmente esses sistemas se confundem na figura centralizadora do fundador. No entanto, com a inevitável pulverização do patrimônio e, consequentemente, do poder de decisão ao longo das gerações, cada uma dessas esferas se distingue mais claramente e adquire dinâmica própria de crescente relevância.

O círculo da família é permeado por questões de ordem afetiva, enquanto o do patrimônio formado não apenas pela empresa, mas também por ativos como imóveis, investimentos e participações em outras companhias é pautado em grande medida pelos aspectos legais e contratuais. Na empresa, por sua vez, concentra-se muito da visibilidade e da realização de curto prazo.

Essa característica intrínseca à evolução das sociedades familiares, ou seja, a de ser constituída por três subsistemas com forte e permanente interação entre eles não pode ser ignorada. Quando se trata de planejar a sucessão e a continuidade em empresas familiares, os cuidados e a atenção com o que se passa no interior da família são fundamentais. Caso contrário, corre-se o risco de ver todo o conjunto ruir por questões pertinentes a um de seus alicerces.

Assim, podemos definir sucessão, no contexto das famílias empresárias, como o processo pelo qual ocorre a transição do fundador ou dos líderes da atual geração nas esferas da família, do patrimônio e da empresa para lideranças da nova geração. Cada esfera passará por seu próprio processo de sucessão, com a legitimação de sua própria liderança, de perfil específico.

A partir desse ponto de vista, cai por terra a imagem de um sucessor único, o “escolhido”, geralmente aquele que vai assumir a gestão dos negócios. Na verdade, mais adequado é pensar em sucessores. Em outras palavras, considerando que cada um dos sistemas exige um processo de sucessão específico, os sucessores são aqueles que se legitimam na liderança de cada uma das três esferas família, patrimônio e empresa que compõem a sociedade familiar, assim como em seus diversos fóruns de decisão. Nos círculos da família e do patrimônio, o sucessor é necessariamente um dos familiares. Na empresa, pode ser um familiar ou não.

Novas lideranças nos três círculos

O processo de planejamento da sucessão e da continuidade nas empresas familiares é permeado pela busca e pelo desenvolvimento de novas lideranças. Esse esforço deve levar em conta a empresa foco natural das preocupações, mas também a família e o patrimônio. Se for verdade que, a cada nova geração, a empresa precisa de um novo líder, não é menos verdade que a família, controladora da empresa e detentora do patrimônio, necessita que suas lideranças sejam renovadas.

Há uma tendência comum, dentro e fora das famílias empresárias, de pensar que o filho mais velho pode desempenhar todos esses papéis, especialmente na transição da primeira para a segunda geração. Dificilmente.

O pai, fundador da empresa, comandou com êxito os negócios, esteve à frente da família e tomou as principais decisões referentes ao patrimônio, em geral ao lado da mãe. Na ausência dele, entretanto, evolui-se para um modelo decisório coletivo, marcado pela relação societária. Nunca é demais lembrar que nesse novo cenário ninguém detém sozinho o patrimônio ou pode decidir por conta própria e risco o futuro da empresa e isso é decorrente da pulverização natural e inevitável em famílias com mais de um herdeiro.

No esforço de procura e desenvolvimento de lideranças, é fundamental ter em mente que, nessa nova realidade, para exercer a liderança em cada uma das esferas, são necessárias pessoas de perfis distintos, correspondentes a cada uma delas.

Quando se trata da liderança da gestão dos negócios, busca-se alguém em sintonia com o mercado e com o setor de atividade da empresa e que possua sólida formação, qualidades profissionais e experiência. Alguém que saiba compartilhar suas idéias, debatê-las e, sempre que se fizer necessário, tomar decisões. Alguém que conte com o respeito tanto de quem trabalha na companhia como dos demais grupos de interesse como clientes, fornecedores, associações de classe, instituições financeiras etc.

Essa liderança exercerá o poder visível, voltado para fora da família, embora deva ter condições de gerar informações acessíveis a todos os sócios. Para sua posição, há uma descrição de cargo clara e experiência exigida, de acordo com parâmetros de mercado, além de indicadores para aferição de resultados. Pode ser desempenhada por um membro da família ou por um profissional de fora dela.

A liderança familiar está voltada para dentro da família e deve ser, necessariamente, exercida por um membro desta. Somente alguém que pertença ao grupo contará com a legitimidade que se requer para exercício desse papel ainda que conte, para isso, com os serviços de profissionais externos.

Idealmente, a liderança familiar deve ser uma pessoa com capacidade de diálogo e que saiba, por exemplo, compor interesses e ouvir tanto ou mais do que falar. A realização pessoal e profissional dos membros da família é uma das preocupações mais importantes dessa liderança, assim como a formação das novas gerações para que estejam preparadas para desempenhar seu papel societário.

A coordenação da esfera do patrimônio, exercida geralmente a partir da liderança do conselho societário, que reúne os sócios-controladores, relaciona-se diretamente, e ao mesmo tempo, com a família e com a empresa. Assim, é importante que reúna as condições necessárias para articular as pessoas e os núcleos familiares. Desse modo, representará os interesses de quem não está diretamente envolvido com a gestão da empresa quando o futuro dos negócios e do capital for colocado em jogo.

Apesar de sua importância, esse líder deve estar disposto a trabalhar com baixo nível de exposição, quase invisível aos olhos do mercado. Precisa entender o que se passa nas esferas do patrimônio e da empresa, até mesmo para cobrar dos gestores do negócio os resultados esperados por todo o grupo, e desempenhar esse papel na perspectiva de quem exerce o controle societário, buscando o melhor retorno possível sobre o capital e levando em conta a gestão do risco.

As lideranças que atuam no âmbito da família e da sociedade nem sempre são formalizadas. É comum ver um irmão mais carismático, apaixonado pelo dia-a-dia dos negócios, ser alçado à condição de presidente da empresa e, aos olhos do público externo, deter todo o poder. Ao mesmo tempo, um irmão ou uma irmã de perfil mais discreto conta com tal confiança dos demais que acaba sendo o articulador do grupo, exercendo um poder real com alto impacto sobre todas as esferas, inclusive a da empresa.

Na evolução da família empresária, entretanto, é importante formalizar a atuação das lideranças, o que acontece em sintonia com a criação das estruturas de governança: o conselho de família, o conselho societário no âmbito do patrimônio e o conselho de administração.

Legitimação: um passo fundamental

A legitimação é uma etapa-chave na identificação de novas lideranças. A legitimidade é fruto da conquista pessoal dos sucessores. Depende de seu desejo de assumir essa posição, de sua capacitação para isso, mas também do desejo e reconhecimento por parte dos demais membros da família. Dos novos líderes espera-se que tenham boa relação e trânsito entre todos os sócios familiares.

O desafio diante dessas novas lideranças é o de lidar com uma sociedade entre irmãos ou primos e, assim, com um modelo decisório coletivo, que substitui o modelo decisório individual, que marcou as décadas durante as quais o fundador da empresa esteve à frente da família e dos negócios. Portanto, é importante que os futuros sócios participem ativamente da definição das futuras lideranças, a fim de que estas obtenham a legitimidade necessária para o exercício do poder.

Esse encaminhamento deve ser negociado o máximo possível, tendo à frente do processo o fundador ou líder da atual geração. A imposição do “filho preferido” ou do “mais preparado”, sem um esforço de inclusão dos demais, geralmente deixa marcas negativas de difícil superação entre os irmãos e, vale repetir, futuros sócios, com impacto sobre a continuidade da empresa.

O processo sucessório nas famílias empresárias vai muito além da simples substituição de um presidente por outro na empresa controlada por essa família. A boa notícia é que, quando planejada e bem conduzida, essa sucessão também pode gerar benefícios que vão além dos mais óbvios, desde o estreitamento dos laços entre os sócios até o fortalecimento da posição competitiva da empresa, com sinais claramente percebidos pelo mercado. Por isso, pensar o futuro é uma prioridade, a ser abraçada por todos os que fazem parte da família empresária.