Romilda Consolação dos Santos tem 34 anos e apenas em 2009 conseguiu o primeiro emprego com registro em carteira profissional, como rejuntadora. Antes, ela havia trabalhado como babá, manicure e cabeleireira. Depois de terminar um curso técnico de pedreiro no Senai de Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, ela foi imediatamente recrutada por uma construtora como auxiliar de pedreiro. Em pouco mais de dois anos na empresa, Romilda foi promovida três vezes e conseguiu dobrar o seu salário.
Veja em vídeo o depoimento de mulher que trabalha em um canteiro de obras
O salário médio real de contratação da mulher na construção civil já é maior que o do homem. No primeiro trimestre deste ano, ele foi quase 6% maior. O baixo índice de desemprego na economia brasileira e o aquecimento do setor na última década chamaram a atenção para as oportunidades que surgem, principalmente aquelas que exigem certo grau de detalhismo, como o acabamento. É nesse espaço que profissionais como Romilda têm se destacado. O diferencial das mulheres é que, na hora de se candidatarem a uma vaga, elas estão mais qualificadas e acabam fechando salários maiores, segundo analistas de mercado e profissionais de recursos humanos consultados pelo Valor.
De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o valor médio pago a profissionais da construção civil no primeiro trimestre deste ano ficou em R$ 1.066,36. Mas são as mulheres que puxam a média para cima, já que elas receberam 5,65% mais que os homens. Esse índice não significa que o salário das mulheres é maior, mas sim que, ao serem contratadas por uma empresa do setor, elas começam ganhando mais, seja pelo tipo de função que exercem, seja pela experiência que trazem de outros empregos.
Além da construção civil, a mulher entra na profissão ganhando mais que o homem em apenas outros dois setores: extrativa mineral e serviços industriais de utilidade pública. Nem na educação, nem na saúde, isso ocorre, segundo os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Na média do país, as mulheres são contratadas com um salário médio 15% inferior ao do homem.
“A presença da mulher na construção civil ainda é muito pequena. É óbvio que ela não entra no setor para carregar tijolo, pelo contrário, ela entra mais qualificada e vai trabalhar com pintura, na parte hidráulica ou operar máquinas e equipamentos”, explica Ana Maria Castelo, coordenadora de estudos da construção civil da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Na construtora mineira Caparaó, para quem Romilda trabalha, a presença das mulheres no canteiro de obras ainda é bem pequena. “Não chega a 5%, mas esse índice está crescendo, porque falta mão de obra especializada e muitas mulheres estão se qualificando para atuar no setor, que paga bem”, explica Silvano Aragão, gerente de recursos humanos.
“Onde eu trabalho, sou a única mulher. Mas vejo que a empresa me valoriza, por isso quero fazer um curso de qualificação. Existe espaço para eu crescer aqui dentro”, afirma Romilda. “Elas são muito comprometidas no canteiro de obras. São detalhistas, cuidadosas e acabam subindo na profissão mais rápido”, diz Aragão.
Enquanto as mulheres representam 20% do quadro geral de funcionários da construtora Tecnisa, nos canteiros de obra elas são apenas 4%. A diferença se explica por elas desempenharem funções mais administrativas. “O uso maior de tecnologia tanto na área fabril como na construção civil permite que o trabalho feminino no setor avance. Métodos construtivos que utilizem menos força física e o uso de automação na fabricação de componentes também ajudam”, diz Marcello Zappia, diretor de recursos humanos da empresa, que acredita haver espaço para as mulheres no setor.
Zappia levanta um diferencial que destaca as mulheres no exercício de suas funções. “A mulher tem mais capacidade que o homem em ser multitarefa. Elas se destacam na própria ação do engenheiro, que acompanha várias frentes de trabalho ao mesmo tempo. E também se sobressaem em serviços que exigem cuidados mais elaborados e atenção para detalhes.”
Jessica Clarissa da Silva, de 24 anos, também é a única mulher nos canteiros de obras em que trabalha – ao todo, quatro, em São Paulo. Ela fez um curso de dois anos em técnica de segurança e orienta trabalhadores sobre ergonomia, planos de emergência e segurança em geral durante as diferentes etapas de uma obra. “Comecei na indústria metalúrgica, mas surgiu uma oportunidade melhor na construção civil. Gosto tanto da área que, agora, estou cursando uma faculdade de engenharia”, conta.
O salário inicial de Jessica na construção civil equivalia a cerca de três salários iniciais de um auxiliar de pedreiro na mesma obra. Hoje ela ganha 20% a mais do que ganhava há dois anos, quando mudou de ramo.
Entre os oito grandes setores analisados pelo MTE, o salário médio de admissão das mulheres também é maior que o dos homens na indústria extrativa mineral e nos serviços industriais de utilidade pública. Na indústria de transformação, a “vantagem” masculina é bem alta. Em média, elas recebem 80% do salário de admissão dos homens. O salário real médio de admissão do país ficou em R$ 993,44 no primeiro trimestre deste ano, sendo que a média masculina (R$ 1.045,10) foi 15,5% maior que a média feminina (R$ 904,76).